Her Brother (1960) de Kon Ichikawa: **
Kon Ichikawa já teve melhores dias: apesar do espectacular enquadramento e do tratamento sublime da imagem, a narrativa é demasiado insípida para nos revermos na aflição da irmã ou sofrermos, como se pretende, com o desaparecimento do irmão.
Kon Ichikawa já teve melhores dias: apesar do espectacular enquadramento e do tratamento sublime da imagem, a narrativa é demasiado insípida para nos revermos na aflição da irmã ou sofrermos, como se pretende, com o desaparecimento do irmão.
The Catch (1961) de Nagisa Oshima: ****
Adaptado de um conto do escritor Kenzaburo Oe, The Catch é uma negra viagem pelos contornos agressivos de uma existência egoista, destruidora e selvagem, mascarada de consciência de interesse colectivo. Tecnicamente, funciona como um Night and Fog in Japan (1960) filmado a céu aberto, com os seus planos sequência longos e corridos, e movimentos de câmara arriscados, sublinhando assim a sua componente mais aterradora e diabólica, já que desde o princípio até ao fim, somos mergulhados na perigosidade de uma aldeia sem lei, num tempo indigente, pronta a tudo para saciar interesses que passam pelo sangue, sexo e poder. Assim, aquilo que os habitantes da aldeia chamam animal é na verdade mais humano do que todos eles. O espectador, semelhante à condição do soldado negro, está descituado e mudo como ele, sem expressão na condição de testemunha que vê até onde chega o horror deste povo. Diria que até 66, esta é a melhor obra de Oshima.
The Husband Witnessed (1964) de Yasuzo Masumura: ***
Um Masumura que começou de maneira bem negra (uma espécie de cruzamento entre o fulgor narrativo de Black Test Car e o carácter psicosexual de um Manji) e que infelizmente se torna demasiado melodramático para passar convincentemente a mensagem pessimista que tem em relação à competitividade e desumanização do sistema empresarial (sociedade) japonês.
Mushuko Mono (1964) de Kenji Misumi: *
Típico filme de estúdio, isto é, no seu mau sentido, um filme que tresanda a emprego, e pouco a criatividade (a criatividade relativa ao emprego). Nem Raizo Ichikawa salva Mushuko Mono desta razoabilidade comichosa.
The Hoodlum Soldier (1965) de Yasuzo Masumura: ***
The Hoodlum Soldier está traçado a meio caminho entre um entretenimento de boçalidades violentas e uma crítica mais profunda (presente em Red Angel de modo mais perfeito) à guerra, ao espírito de guerra e a todas as suas adjacências. Com um Shintaro Katsu doido - e apesar de uma estrutura narrativa que poderíamos classificar como episódica - o filme agarra o espectador até ao final.
Nakano Spy School (1966) de Yasuzo Masumura: ****
Tremendo este exercício de pessimismo por parte de um Masumura mais contestatário do que nunca, quanto ao vergar-se colectivo de valores eticamente aceites, mas eticamente inaceitáveis. Se Raizo Ichikawa povoa com mestria a segunda parte do filme, a primeira deve-lhe todo o mérito a Daisuke Kato, que tem uma das suas melhores interpretações de sempre. Quanto à parte formal, preto-e-branco cinemascope com enquadramentos que representam o estado de espírito dos personagens, mais uma intensa banda-sonora. Um dos seus melhores.
Naked Bullet (1969) de Koji Wakamatsu: **
Este
filme de Wakamatsu é uma versão erótica do típico filme de yakuza.
Alguns momentos são intensos, mas a narrativa diminuta e os problemas
típicos de budget, desta vez, limitam bastante a experiência. Ainda
assim, de realçar a banda-sonora do grande Yosuke Yamashita!
The Woman Who Wanted to Die (1970) de Koji Wakamatsu: ****
Fantasmagórico, este exercício sobre a banalização do suicídio e/ou a sua possível componente redentora. Com citações directas e menções jornalísticas e fotográficas do harakiri de Yukio Mishima, Wakamatsu e Adachi são inteligentes o suficiente para não subscreverem na integralidade as ambições Mishimanas (como seria quase esperado, dado o furor e o carácter recente desse acontecimento), mas antes olharem para elas com um olhar algo crítico.
Lost Chapter of Snow: Passion (1985) de Shinji Somai: ****
Se ao menos pudesse existir uma versão com uma qualidade de imagem melhorada, isso permitiria que qualquer leigo pudesse testemunhar o carácter extremamente misterioso e complexo da filmagem de Somai: não meramente uma formalidade intrincada, mas um modo de apresentação relativo à disposição (espacial e psicológica) dos personagens.
About Her Brother (2010) de Yoji Yamada: ***
O que era um filme, mais ou menos, insuficiente de Ichikawa, Yamada afinou-o um bocado, mantendo a temática abstracta do amor fraterno, mesmo quando posto nos piores momentos e mantendo também um pequeno pormenor visual (o laço que os une, no momento derradeiro). Tirando isto, About Her Brother é um filme diferente e independente do outro, mais rico não só nas interpretações, mas nos momentos da própria narrativa (relembro sempre que Yamada é o derradeiro realizador shomin-geki vivo por excelência) que conservam uma intimidade do quotidiano que é tradicional a certo cinema japonês.
Outrage (2010) de Takeshi Kitano: ***
Este é talvez o filme mais estranho de Kitano: só isso já quer dizer muito. Em primeiro lugar, os que pensavam que iam ver um Kitano curvando-se a exigências comerciais não podem estar correctos. O que conta aqui é a subtileza do literal. Outrage é tão literal, tão pouco subtil que não há comercialismo que aguente. Isto é um filme constantemente agressor e agressivo, não só para o espectador comum (violência etc.), como para o típico seguidor da obra de Kitano: há muito pouco ou nada de Kitanesco em Outrage, de tal maneira que o simples facto de estarmos à espera daquilo que caracteriza o estilo kitanesco permite de cada vez, sairmos frustrados. Consideremos a recusa do plano fixo, do encarar a câmara, recusa da elipse como pudor de montagem, mas, mais decididamente, veja-se a recusa da constante ambiência fúnebre dos personagens (reflexo do estilo kitanesco): em Outrage os personagens estão absorvidos pelo excesso de energia e vida. Nenhum está trespassado por aquela forma de dormência kitanesca, que é afinal, uma antecipação da sua morte. Aqui, pelo contrário, a morte surge como excesso de poder e ambição de outrem, excesso da vida de si mesmo que destrói o excesso de poder alheio. Por isso é tão estranha a narrativa de Outrage: relações de poder organizadas sobre uma esfera anárquica de sentido de tal modo que todos os envolventes se interferem de alguma maneira, bastando apenas subverter a perspectiva de interferência. Todos são susceptíveis de se interferirem e quando isso acontece, só a morte surge. Outrage não é um espectáculo de estilização da violência, mas antes um valente murro no estômago, não ao modo da desconstrução dos seus outros três filmes, mas porque nada de puramente kitanesco sobrevive aqui. O que é afinal Outrage senão uma espécie do filme paródia yakuza de Kantoku Banzai mas com mais uma hora e meia? Roger Ebert disse que o que Outrage mostrava numa hora e quarenta minutos, poderia mostrar em vinte. Mas a narrativa aqui conta pouco, a maneira como Kitano descalça a "bota" é que conta: não caí num travestismo de estilo (como acontecera em Brother), nem tão pouco é comercial, no sentido, em que não permite nada mais do que raiva, ira e destruição, a bem de um suposto entertenimento que se ri de si mesmo.
Sem comentários:
Enviar um comentário