30/10/12

Fragmentos de 2010/10/02


Only On Mondays (1964) de Ko Nakahira: ****
Se a primeira parte do filme ergue uma estética baseada puramente no erotismo sugerido (diria mesmo que a mímica irrepresentável de Mariko Kaga e o constante jogo de "nudez" (física e não só) jamais mostrada, mas sugerida, faz que certas cenas deste filme sejam das mais eróticas da história do cinema japonês), a segunda, porém, transforma-se num drama mais ou menos hard-core (à parte de inúmeros truques estilísticos) sobre a libertação de um modus-vivendi sexual imposto e confinado à mulher.



Silence Has no Wings (1966) de Kazuo Kuroki: ****
Apesar de, em certos aspectos, alguma simbólica estar datada (e por causa disso tornar o seguimento no seu todo dificultado), Silence Has no Wings não deixa de ser um tremendo, abstracto e alegórico exercício sobre as "amarguras da Era Showa" em jeito de turbilhão incontrolável de imagens, sons e sentidos. Para além de ser, em minha opinião, a primeira obra ATG (relembre-se: estamos em 66!), no sentido em que a criação é sobretudo um dispositivo em que o não-existente, existe, Kuroki engendra no seu formalismo ora intimista, ora torrencial "pequenas (grandes) histórias" e momentos que não achei de modo nenhum enfadonhos, antes pelo contrário. É certo que o que haveria de vir foi, em certos aspectos, aperfeiçoado (talvez menos caótico e menos circunstancial), mas o valor deste filme-poema audaz não pode ser negligenciado. Que venham os próximos Kuroki's!



Shadow of Deception (1971) de Koichi Saito: ***
Mais uma agradável surpresa de Koichi Saito. Um thriller bem equilibrado, e que deve muito do seu mérito à grandiosa interpretação de Shima Iwashita. 




Tokugawa Sex Ban (1972) de Norifumi Suzuki: **
Sabemos que Norifumi Suzuki (também Yuuji Makiguchi, mas principalmente Teruo Ishii) não são propriamente defensores de um estilo contido, cinematica e tematicamente falando. O mote reside em abusar da linguagem cinematográfica e sexualizá-la. Este Tokugawa Sex Ban, filme fulminante, faz do exagero e da abertura transgressiva um motivo de quase caricatura. Certas produções desta altura e deste calibre reflectem esta falta de seriedade, e é sempre curioso notar que o próprio espectador já não sabe como há-de reagir: trági-cómicamente no meio de uma demoníaca e kitsch experiência. 



Shinobugawa (1972) de Kei Kumai: ****
É espantoso: não me lembro de um filme que, tendo todas as condições para se finalizar no extremo mais pessimista de todos, se decide resolver precisamente naquilo que colocara dúvidas durante mais de metade do tempo, isto é, o amor. A sua magia (a sua doçura irreal) vem justamente do facto (certamente duvidoso, mas le cinéma c'est le cinéma) de que perante a angústia de viver, o amor vence.



A Distant Cry from Spring (1980) de Yoji Yamada: ****
Um filme que alia uma carga emocional forte, a uma portentosa fotografia pastorícia, e - como é habitual nos filmes de Yamada - excelentes interpretações (o par típico de Yamada: Chieko Baishô e Ken Takakura...).



Wandering Peddlers (1995) de Mitsuo Yanagimachi: ***
Um documentário Yanagimachiano que propõe uma viagem para dentro daquilo que eu chamo "a experiência Taiwanesa" . Linguagem, paisagens, experiências, modos de viver e sobretudo uma maneira singular e deambulante de contar narrativas para além da narrativa.



Vortex & Others (2001-2008) de Yoshihiro Ito: ***
Um curioso experimentalista no domínio imagético e temático, Yoshihiro Ito nestas cinco curtas (que vão do besta, Non Intervention Game (2008) ao bestial, Vortex (2005)) apesar de relembrar, por vezes, certos laivos Iwaianos, demonstra uma criativa inteligência, acompanhada por um sentimento agri-doce de novidade.



Brass Knuckle Boys (2008) de Kankuro Kudo: **
Kankuro Kudo (que nos tinha trazido Yaji and Kita, essa comédia bem-disposta e por vezes hilariante) fez, desta vez, uma outra comédia punk, isto é, não-musical mas baseada na atitude selvagem de um banda cinquentona, novamente reunida por uma empresa discográfica. Ao que o filme faria prever e conhecendo o estilo de Kudo, peca-se aqui por repetição do argumento (basicamente variando entre as zangas e sucessivas reconciliações entre os personagens), uma duração inapropriada (2 horas) para os conteúdos e o estilo tratado, e certos momentos que não fariam diferença nenhuma se fossem discriminados. À parte disso, boas interpretações e razoáveis níveis de comicidade. 



Punch the Blue Sky (2008) de Go Shibata: *
Depois da complexidade chocante de Late Bloomer, Go Shibata mudou de ares e de disposições criando este filme juvenil sem muito cabimento, com um par de momentos interessantes, que mesmo assim não salvam a trama frágil, os personagens simplificados ao máximo e um sentimento geral de imaturidade fílmica que nos parece não intencionada.



Golden Slumber (2010) de Yoshihiro Nakamura: **
O estilo de Yoshihiro Nakamura veio-se consagrando à medida que o tempo passa e as mesmas fragilidades de filmes como The Foreign Duck, the Native Duck and God (2007) e Fish Story (2009) ainda permanecem neste Golden Slumber, sendo que umas ainda se acentuam mais. O problema da duração é inevitável: não sou contra filmes longos, mas o que sumariamente se nota nos filmes japoneses mais recentes é uma duração descentralizada da narrativa, de tal modo que o ritmo de um filme que se quer rápido, torna-se despropositadamente enfadonho, justamente nas partes em que a ênfase deveria residir no estudo emocional das personagens. Diria mesmo que um dos problemas de Nakamura é o que o constituí, isto é, o carinho e dedicação pelos seus personagens torna-os protagonistas de um tempo indevido, se relacionarmos esse tempo com o tipo de narrativas a que se propõe. A recepção ainda é a mesma: não sei se é pelo comercialismo (que Nakamura não esconde ter) ou se é por uma dificuldade em equilibrar conceitos e modos de filmar.


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