28/10/12

Fragmentos de 2010/03/15


Erotic Liaisons (1992) de Koji Wakamatsu: *
Produzido pelo odioso Kazuyoshi Okuyama, este pequeno e insignificante filme fica na história antes que não seja por ser o embaraço fílmico de Koji Wakamatsu, e o último filme de Yuya Uchida no qual ele encarna uma personagem principal (depois de alguns míticos papeis durante os anos 80). Se Wakamatsu aqui pactua e demais com o sistema dos reducionismos comerciais (tudo é de uma facilidade bocejante), o discurso inicial de uma responsável de Estado francesa, é prova de um auto-flagelamento diabólico: "um filme ridículo feito com yens japoneses". Como se Wakamatsu se estivesse a rir desalmadamente da sua figura num espelho: de revolucionário belicoso a corsário ressacado. O dinheiro (ou a necessidade dele) faz destas coisas...



Barren Illusions (1999) de Kiyoshi Kurosawa: ***
Se Kairo era a canonização artística de problemas de comunicabilidade graves, este é o seu antecedente perfeito. Barren Illusions tem até algo de Tsai Ming Liang: a ocupação física dos corpos é mesmo posta em questão com um fade metafórico sobre o corpo do protagonista, como se, a mente se evaporasse no silêncio da sua melancolia. Para não adiantar mais, poder-se-ia dizer que Barren Illusions é o típico filme que, centrando-se na confusão indistinta do silêncio, se faz desaparecer sensivelmente, como o sol que se esconde tristemente nas nuvens.



Hole in the Sky (2001) de Kazuyoshi Kumakiri: ****
Este filmão de Kumakiri (autor famigerado pelo gore e pela negritude) escapa a qualquer expectativa. Interpretado pelo magnífico Susumu Terajima (talvez o papel da sua vida) e pela igualmente virtuosa Rinko Kikuchi, Hole in the Sky actua num registo tão subtil que o seu poder só pode residir mesmo no não-expresso, no visto. Imersos nas paisagens desoladas e tristes de Hokkaido, é com uma consequente necessidade de afinidades que o próprio espectador observa os personagens enlaçarem-se e desenlaçarem-se. E nada de mais silencioso e de deserto, do que aquele plano de Terajima olhando para o seu reflexo solitário numa poça de água.



Antenna (2004) de Kazuyoshi Kumakiri: **
Querendo ser amargurado na descrição dos afectos humanos, Kumakiri desenha uma espécie de petulância filmica, com traumas à mistura e uma narrativa propositadamente disjunta e aguçada nos picos. O resultado final, surpreendentemente, é muito menor do que se esperava. Para além da interpretação de Ryo Kase, o mundo de Antena é, quase, bizarramente ridículo e, quer sejamos surrealistas ou não, pouco convincente. 



Green Mind, Metal Bats (2006) de Kazuyoshi Kumakiri: ***
Honestamente cinematógrafo: no "meio" é que está a virtude. E, de facto, com poucos meios também se fazem boas propostas. Kumakiri aqui liga histórias, personagens de uma real sensibilidade e passados reencontrados num filme que se consagra, muito para além do baseball. De realçar a aparição rara de Koji Wakamatsu! 



Freesia: Bullet Over Tears (2007) de Kazuyoshi Kumakiri: *
Desonestamente cinematógrafo: no "extremo" é que está a virtude. Freesia é o típico falhanço do manga caprichoso a querer ser filme. A narrativa e os personagens - que se querem apáticos, como verdadeiras odes à insensibilidade - deixam-nos a nós, indolentes, desinteressados, monstruosamente entediados com tanto pretensiosismo e com tanto "querer" ter estilo à banda-desenhada.



Non-ko (2008) de Kazuyoshi Kumakiri: ***
Um regresso parcial àquilo que tinha corrido tão bem, Non-ko serve como pedra-de-toque para as relações conflituosas no silêncio de A Hole in the Sky. Se, não há dois filmes iguais, Kumakiri centra-se desta vez (e ao contrário de Hole) na mulher que necessita amar, tortuosamente e nem sempre da maneira mais esclarecida. O final tem algo de sincero e intimista, pois que se anuncia uma possibilidade para, fora do filme, nas nossas cabecinhas, a coisa correr bem.



The Cannery Boat (2009) de Sabu: ***
Esta esperada adaptação, pela mão do desaparecido (mas não morto!) Sabu, de um célebre romance do comunista Takiji Kobayashi (e que serviu de base para um remake do filme com o mesmo título, feito em 1953 pelo actor-realizador Sô Yamamura) levava a crer que este seria um projecto de alto risco. Por um lado, por dificilmente sair da prisão criativa que é o remake, e por outro pelo facto inegável de que a própria história original pudesse ser associada a uma temática que aparentemente nos dirá pouco nesta viragem da década. Pois bem, Sabu não desiludiu, e Kanikôsen consegue, de alguma forma, transcender a categorização de filme histórico e é como se de uma alegoria se tratasse. O problema da alienação do trabalho, da exploração e submissão imperial é entrelaçada com o estudo humanista dos personagens que, ao contactarem com os russos, aprendem o caminho ora radiante, ora tortuoso da liberdade (e Ryuhei Matsuda: que papel!). De facto, sofremos por elas e é com elas que descobriremos a esperança (mas só ela). Afinal, outra coisa não se pediria para Kanikôsen funcionar, isto é, tornar o histórico, narrativo. O político em pathos.

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